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Gil Reis*

Nunca a conectividade foi tão importante quanto nestes tempos da devastadora pandemia da covid-19. Com as restrições à mobilidade, em consequência do isolamento social, horizontal ou vertical, a comunicação virtual se tornou ainda mais essencial ao nosso cotidiano, tanto para matar a saudade dos pais, de irmãos, de amigos, de um amor isolado em outro canto, quanto para o trabalho home office, desde às simples rotinas ao fechamento de negócios.

Na atividade agrícola, a telecomunicação virou uma ferramenta de primeira hora bem antes da pandemia. Há anos, a tecnologia e inovação chegaram ao campo e emprego delas avança cada vez, principalmente por causa do desenvolvimento de novas ferramentas – muitas saídas das mais de mil startups agritechs surgidas com o apoio de renomadas aceleradoras e de instituições públicas, como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Não é só para produzir alimentos que a área rural necessita de conectividade. Atualmente, os sistemas educacionais, de saúde, segurança e transporte também precisam estar conectados. Inaceitável restringir o acesso de nossas crianças ao pleno conhecimento porque professores e escolas estão parcial ou totalmente desconectados involuntariamente; incompreensível que nossas auxiliares e técnicos de enfermagem, enfermeiros, médicos, fisioterapeutas, farmacêuticos e policiais e transportadores penem para buscar informações essenciais às suas atividades.

No agronegócio, a expansão da tecnologia e inovação animou o governo federal a lançar, por meio de parceria entre os ministérios da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) e o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), a Câmara do Agro 4.0, em setembro do ano passado. “Essa iniciativa visa a ampliar a conectividade no campo e estabelecer ações para que o Brasil seja um exportador de soluções de internet das coisas com aplicação no agronegócio”, disse, na ocasião, a ministra Tereza Cristina.

De lá para cá, mesmo com a pandemia, o setor agritech não parou, indo no rastro do agro, que manteve a produção de alimentos. Empresas de inovação e tecnologia, jovens ou já com tradição no mercado, continuaram desenvolvendo e apresentando soluções para modernizar e impulsionar a atividade agrícola, mas a conectividade no campo segue capenga, mesmo com o empenho da ministra da Agricultura e do ministro Marcos Pontes.

Sem dúvida, a conectividade permitirá que passemos a exportar, além de alimentos, soluções de internet das coisas com aplicação ao agro e outras inovações capazes de contribuir com o avanço da agropecuária mundo afora, a fim de que possamos   superar a grande fome prevista por todas as organizações internacionais em consequência do crescimento da população e, agora, da pandemia da covid-19.

O Brasil inegavelmente é um dos poucos países do planeta com vocação, terras suficientes e clima capazes de alimentar o seu povo e alavancar a alimentação dos povos dos outros países ao redor do mundo. Porém, hoje a conectividade ainda é um sonho incompreendido por setores fora do agro e tem que enfrentar o desconhecimento, a legislação inadequada e a cupidez dos estados e municípios.

Para que possamos resolver de vez o gargalo da conectividade, precisamos ter uma legislação adequada e menos demandas judiciais em torno do assunto. No início do mês passado, por exemplo, a Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) ação direta de inconstitucional (ADI) pedindo a declaração de inconstitucionalidade do art. 12 da Lei n.º 13.116/2015 (Lei Geral de Antenas – LGA).

O que diz o   Art. 12 da Lei 13.116/2015: “Não será exigida contraprestação em razão do direito de passagem em vias públicas, em faixas de domínio e em outros bens públicos de uso comum do povo, ainda que esses bens ou instalações sejam explorados por meio de concessão ou outra forma de delegação, excetuadas aquelas cujos contratos decorram de licitações anteriores à data de promulgação desta Lei.”

Na ADI, a PGR alega que a lei fere a autonomia de estados e municípios para gerir seus bens, o regime de preços livres – não tarifados – da maior parte dos serviços; e a não-qualificação das telecomunicações como serviço público.

Essa ADI nos remete a dois raciocínios: falta de conhecimento dos benefícios da conectividade para a atividade agrícola e a cupidez dos estados e municípios. Sim, governadores, prefeitos e até legisladores enxergaram na conectividade uma chance de tonificar os desmilinguidos cofres estaduais e municipais.  Tanto que, mesmo antes da crise, já estavam taxando a instalação de torres de transmissões e os serviços, dificultando o acesso, em razão do custo, da maioria dos produtores à conectividade.

Tal comportamento é um “tiro no pé”, porque eles esquecem  que o agro é responsável por cerca de 25% da arrecadação tributária, sem falar que os produtores são consumidores como qualquer outra pessoa, o que alarga a base de arrecadação até quase 50%, trazendo mais recursos para os cofres públicos e desenvolvimento ao país.

Esperemos que o bom senso, amparado na legalidade, prevaleça na Suprema Corte e que a ADI da PRG seja rejeitada. Contamos também com a manifestação e esforço do ministro das Comunicações, que sempre demonstrou, como deputado federal, preocupação com o acesso à internet no interior do Brasil, o que só ocorre com conectividade ampla e estável.

*Consultor em agronegócio

Fonte: agroemdia.com.br