O geneticista Raysildo Lôbo diz que a ciência deve evoluir muito, elevando a produtividade da pecuária, a uma maior integração genômica e que a próxima fronteira é a saúde animal no melhoramento genético

Um estudo inédito promete ‘abalar’ as estruturas da pesquisa do melhoramento genético de bovinos no País. Antes, se as pesquisas eram conduzidas de forma separada, raça por raça, agora, os pesquisadores querem subverter essa lógica e avaliar todas ao mesmo tempo. Isso ocorre entre as raças zebuínas de corte como o Nelore, o Brahman, o Guzerá, o Tabapuã e o Senepol.   

O projeto desse estudo foi um dos temas discutido no programa DBO Entrevista, que foi ao ar no dia 27/1, que trouxe uma das maiores autoridades no estudo do melhoramento do zebu no País, que vem sendo realizado através de programa há cerca de meio século, o médico veterinário e professor Raysildo Lôbo, presidente da Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP).

“Nós começamos a trabalhar numa área, num projeto internacional, que pode assustar um pouquinho as pessoas, por isso temos de explicar bem devagarinho. Vamos poder, agora, analisar todas as raças zebuínas, como Nelore, Guzerá, Brahman, Tabapuã, e também o Senepol, todas juntas e misturadas”, diz Lôbo.

O pesquisador deixa um suspense no ar sobre os primeiros resultados dessa pesquisa e seu desenrolar. Mas revela que ela pode trazer muitas vantagens para algumas raças que não têm uma quantidade grande de estudos quando comparadas ao Nelore, como é o caso das raças Tabapuã, Brahman e Guzerá.

Raysildo Lôbo, médico veterinário, professor e presidente da Associação Nacional de Criadores e Pesquisadores (ANCP)

“Vamos fazer essas avaliações conjuntas, mas mantendo as características raciais de cada uma”, diz o pesquisador.

A pesquisa abre um precedente em poder fazer correlações de desenvolvimento e desempenho entre as raças, além do aprofundamento do estudo das origens de linhagens de bovinos.

Em busca do boi ideal

Pesquisas como essas têm um plano de fundo muito prático: aliar produtividade às fazendas e garantir, no final da cadeia produtiva, características como maciez, suculência e mais sabor à carne. Esse é o que move o trabalho diário de Lôbo e centenas de outros pesquisadores na gradual evolução de um rebanho que chega a cerca de 215 milhões de animais no Brasil.

Bovinos nelore são a base do rebanho brasileiro de cerca de 215 milhões de animais

Pode soar estranho, mas, mesmo diante de tantas ferramentas tecnológicas como marcadores moleculares, índice de desempenho genético, através das Diferenças Esperadas na Progênie (DEPs), e estudos de genômica em bovinos, ainda assim, a revolução do melhoramento genético de raças bovinas ainda está apenas começando no País.

“A genômica no mundo começou a partir de 2006. É bem recente. Logo que terminou os estudos do genoma humano, foi publicado o genoma de bovino”, conta o pesquisador.

Foram a partir desses novos dados que as demais ferramentas já estudadas pela pesquisa ganharam mais entendimento, acurácia e agilidade em obtenção de resultados. É partir dessa linha de estudos que o Nelore caminha a passos largos para deixar o estigma de produtor de carne pouco macia, para bater de frente com raças taurinas, como o angus de bife mais macio e suculento.

Carne de bovino nelore ganha cada vez mais atributos de qualidade em função do melhoramento genético. Foto: Reprodução

“Hoje a gente percebe que o melhoramento genético está muito acelerado. Já se cogita que o Nelore possa bater o Angus”, diz o pesquisador.

O desenvolvimento do Nelore tem sido possível graças ao empenho de pesquisadores como Lôbo, que conduziram estudos das raças zebuínas em uma época que o mundo acadêmico internacional ainda dava de ombros para esses animais. Hoje, a história é outra.

“Em 1978, quando fui aos Estados Unidos fazer um pós-doutorado, fiquei muito irritado com alguns professores americanos. Eles diziam que a raça nelore não prestava e as raças brasileiras, como o gir para o leite, não valiam nada. Diziam que tínhamos de adquirir o que estava sendo produzi lá”, conta Lôbo.

No futuro, as doenças

Com o avanço da compreensão da genômica, as DEPs e as interrelações entre as raças, o pesquisador aponta que uma das áreas promissoras de estudos será as que trataram das doenças nos animais.

Segundo ele, é um campo que ainda carece de mais avaliação pela ciência do melhoramento genético.

“A pecuária brasileira ainda registra perdas muito grandes por causa de doenças. A mortalidade pré-embrionária ainda é muito comum, tanto na espécie humana como também nos bovinos. O que vem por aí pode ser algo muito fantástico, em todas as áreas. E podemos ampliar ainda mais a atuação da genômica”, diz Lôbo.

Confira na íntegra a entrevista:

Fonte: portaldbo.com.br