27 de junho de 2022

O fomento de estratégias que reduzam as emissões não é novidade na produção brasileira; pesquisa e profissionais do campo estão nessa luta há décadas

imagem divulgação – site Canal Agro – Estadão

Por Maurício Palma Nogueira

Participando recentemente de um fórum para discutir a questão das emissões de carbono pela pecuária, percebi que há certa dificuldade em compreender os efeitos práticos da relação entre o carbono e a produção. As discussões, quase sempre marcadas por posicionamentos passionais, deixam a desejar no quesito técnico-científico.

A crítica não vale apenas a um dos lados do debate, cuja condução segue contaminada pela polarização política. Críticos ferrenhos do ambientalismo radical também pecam por desconhecer questões básicas de ordem agronômica e zootécnica. Dessa forma acabam, por si mesmo, também adotando uma postura radical contrária às sugestões técnicas que vem sendo apresentadas para melhorar o balanço de carbono.

Desde que conduzido tecnicamente, com base no conhecimento científico consolidado, a redução nas emissões de carbono implicará também em aumento nos resultados financeiros. Esse aumento se explica pelo combate ao desperdício e aumento da produtividade.

Estratégias de redução de emissões pela pecuária envolvem, necessariamente, aumento no desempenho dos animais em produção. Redução da idade ao primeiro parto, redução do período de terminação, aumento do ganho de peso médio, redução da mortalidade, aumento da taxa de natalidade etc. farão parte das ações que contribuirão com as reduções de emissões por unidade produzida na pecuária.

O mesmo raciocínio ocorre com as estratégias de aumento das remoções de carbono (sequestro de carbono). As remoções ocorrerão à medida que o solo acumular maiores quantidades de carbono em seu perfil. Para que isso ocorra, o sistema de produção precisará ser conduzido de tal forma que as sobras de plantas não exportadas (retiradas da área) sejam incorporadas de forma eficiente ao solo. As sobras incluem tanto a parte aérea da planta como as suas raízes. Incluem as plantas de soja, milho, algodão e outros produtos não retirados da área no momento da colheita, assim como o restante não aproveitado das plantas colhidas por inteiro, como é o caso das pastagens e da cana-de-açúcar, por exemplo.

Aí entram os conceitos agronômicos gerados nas últimas décadas pelas universidades e centros de pesquisa do Brasil. Administrar esse processo em ambiente tropical é um desafio que vem sendo superado com muito êxito pelo agronegócio. São conquistas possibilitadas pelo conhecimento de manejo de solo.

Há décadas, muito antes do assunto carbono (que inclui metano) ganhar importância no debate global, alunos de ciências agronômicas estão aprendendo que não se deve queimar o resto das plantas para limpeza das áreas de produção. Exceção aos casos que envolvem prevenção a doenças, específicos em algumas culturas.

Aprendem também que manejar a relação entre carbono e nitrogênio possibilitará ganhos em produtividade ao longo dos anos. Lentamente, as práticas tradicionais de aração e gradagem da área foram substituídas pelo plantio direto e pelo cultivo mínimo. O plantio direto, raro no início dos anos 1990, já ocupa cerca de 40 milhões de hectares em todo o território nacional.

O mesmo ocorre com os sistemas de integração entre pastagens e lavouras (ou florestas). A área conduzida em sistemas integrados, no Brasil, se aproxima de 15 milhões de hectares. Sistemas mais intensivos de produção de pastagens também possibilitam aumento da quantidade de plantas remanescentes (parte aérea e raízes) na área. Por mais eficiente que sejam ao pastejar, os bovinos tendem a retirar apenas cerca de 40% a 50% da matéria seca produzida nas pastagens. Considerando a composição entre raízes e parte aérea nas forrageiras tropicais (pastagens usadas no Brasil), é possível concluir que os bovinos consumirão apenas entre 20% e 30% do total da produção vegetal necessária para mantê-los.

Ao contrário do que geralmente é pregado por especialistas em carbono, porém leigos em conceitos de fertilidade do solo, a capacidade de estocagem no solo pode aumentar ao longo do tempo. Essa, inclusive, é uma das grandes metas agronômicas conduzidas nas fazendas brasileiras: aumentar a capacidade produtiva do solo, o que pode ser comprovado pela elevação da produtividade do País.

Especificamente no caso de pastagens, sistemas mais intensivos de produção ainda possibilitarão outros ganhos em melhoria de balanço de carbono. Operações mecanizadas de correção, adubação e aplicação de defensivos nos pastos demandarão menos combustíveis por hectare do que operações de aração, gradagem e roçada das áreas. A quantidade de diesel, pela mesma quantidade produzida, será inferior.

Enfim, o fomento de estratégias que reduzam as emissões não é novidade na produção brasileira. Pesquisa e profissionais do campo estão nessa luta há décadas. A única novidade é a abordagem diferente, buscando compreender o ciclo de carbono. Mas as ações são as mesmas.

O mesmo vale para o investimento em moléculas que reduzam as emissões de metano pelo bovino. Enganam-se aqueles que acreditam que tais produtos servirão apenas para reduzir as emissões totais dos bovinos. Sem possibilitar aumento da eficiência produtiva e ganho financeiro no processo, essas moléculas não serão incorporadas pelas empresas de nutrição e, muitos menos, pelos produtores.

Por essa razão julgamos de suma importância que o tema seja tratado de forma mais transparente, com linguagem adaptada e, principalmente, com o envolvimento de pesquisadores e profissionais que conhecem o tema relacionado ao solo e construção da fertilidade do sistema.

A forma com que o assunto tem sido comunicado, por ambos os lados da polarização, só atrasará as conquistas reservadas à pecuária brasileira.

Produtores precisam ser conscientizados dos benefícios financeiros obtidos com as reduções nas emissões ou mesmo com o aumento nas remoções de carbono. Políticas de incentivos, via créditos do mercado de carbono, devem ser focadas em viabilizar investimentos nas mudanças necessárias.

Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária

Fonte: summitagro.estadao.com.br